1.26.2011

RUMIÑAHUI - O GENERAL DO OLHO DE PEDRA




"No ano de 1985 o Congresso Equatoriano determinou que o dia primeiro de dezembro de cada ano fosse um dia de lembrar Rumiñahui como herói e defensor do Reino de Quito."

Rumiñahui é um apelido; em quéchua significa " olho de pedra ". Certamente, além das referências históricas, que exaltam sua atitude firme contra os espanhóis, na Batalha de Monte Chimborazo, fora sempre um dos melhores guerreiros, senão o melhor, do exército de Atahualpa. 


Nascido em Pillaro, na atual província de Tungurahua, no Equador, com o nome de Pillahuaso, morreu no dia 25 de junho de 1535, após haver liderado a resistência contra os espanhóis, no norte do Império Inca ( atual Equador), em 1533. Assumiu a resistência, com mão de ferro, depois do assassinato de Atahualpa, pelos espanhóis, em Cajamarca. Os historiadores tendem a crer que tenha sido meio-irmão de Atahualpa, filho de alguma nobre, de Quito, com o Inca Huayna Capac.


Quando Francisco Pizarro prendeu Atahualpa, exigindo o resgate, Rumiñahui, prontamente, marchou para Cajamarca, levando uma grande quantidade de ouro mas, como se sabe, os espanhóis quebraram a palavra e Atahualpa foi morto antes que ele chegasse lá, o que fez com que voltasse a Quito, escondendo o tesouro, como já foi dito, anteriormente, na região de Llanganates.


Tomando conhecimento da resistência de Rumiñahui, Francisco Pizarro enviou seu lugar-tenente, Sebastián de Benalcázar, para tomar Quito e trazer todo o ouro que pudesse ser conseguido. As forças de Rumiñahui e Benalcázar se encontraram na Batalha de Monte Chimborazo, onde Rumiñahui foi derrotado. No entanto, antes que as forças espanholas invadissem Quito, Rumiñahui ordenou que fosse queimada até o chão, e que, as ñustas (virgens do templo) fossem mortas para preservar sua honra. Rumiñahui foi, finalmente, capturado, torturado e morto pelos espanhóis, mas nunca revelou a localização do tesouro.


Como general dos exércitos de Cuzco, Rumiñahui é lembrado por ter participado, em várias campanhas, nas quais ele pode secundar o próprio Atahuallpa e, constantemente, o acompanhava. Com a morte de Huayna Capac a aproximação entre os dois foi, naturalmente, ainda maior, seja pela experiência vivida, seja pela precipitação dos acontecimentos futuros. 
Rumiñahui teve intensa participação na guerra civil, movida por Atahualpa ao seu irmão, legítimo Inca de Cusco, Huascar Inca, mantendo estreito contato com seu líder. No início das hostilidades, esteve presente nos confrontos mais importantes, ao lado de Quizquiz e Chalcochima mas, quando a área de operações foi transferida para a capital inca, ele foi designado para proteger a retaguarda. Desse modo, encontrava-se em Cajamarca no terrível momento da captura de Atahualpa. 
Ao que parece, experiente general, quis atacar os espanhóis no momento de sua chegada; Atahualpa, no entanto, preferiu não fazê-lo. Rumiñahui permaneceu, então, acampado fora da cidade, com um exército armado de cinco mil soldados.
Historiadores e leigos (e eu) deparam-se com uma única questão que, ao que parece, jamais será respondida. 










Por que, então, Rumiñahui não moveu o seu exército e destruiu os espanhóis, naquele momento?
                                                    (minha pergunta de quinhentos anos)



Podemos inferir que a férrea disciplina militar incaica não permitiria que ele tomasse uma tal decisão sozinho, o que o fez esperar pela decisão de Atahualpa, mesmo em poder dos espanhóis. Em segundo lugar, por causa da rapidez da ação e da confusão causada, uma interferência sua poderia atentar contra a integridade física do Inca que, naquele momento, encontrava-se preso bem no meio dos inimigos e da matança.
Quando a derrota inca foi, claramente, exposta, Rumiñahui ordenou a retirada do exército para Quito, sem sofrer nenhuma perda.


Durante o cativeiro de Atahualpa, limitou-se a controlar a presença espanhola, enquanto a coleta do tesouro para o resgate era supervisionada, pessoalmente, por Quilliscache, irmão do Inca. Com a morte de Atahualpa, Rumiñahui percebeu que os espanhóis chegariam até os territórios e preparou-se para agir. Encontrou a oposição de Quilliscache que, preferia usar de diplomacia com os estrangeiros que já haviam dado provas de invencibilidade.


Revoltado com a fraqueza do herdeiro legítimo de Atahualpa, decidiu agir. Com o pretexto de um banquete em homenagem póstuma ao Inca, reuniu todos os parentes de Atahualpa e seus fiéis e, no meio da reunião, prendeu todo mundo. Antes de nomear-se Senhor de Quito, matou a Quilliscache, considerando-o um traidor da terra de seus antepassados. Os cronistas espanhóis fazem um relato macabro dessa morte, o que prefiro não compactuar, pois também haviam dito que ele matara todos os filhos de Atahualpa nessa ocasião, o que não procede, visto que, depois, apareceram vivos.


Inicialmente, as forças espanholas só podiam contar com as tropas de Banalcazar que, por conta própria, aventurara-se na conquista do território do norte, cego pela possibilidade de encontrar ouro, pois era dito que haveria em grande quantidade.
O lugar-tenente de Pizarro, acompanhado de Almagro, veio, logo, juntar-se a ele, com poucos homens, no sentido de fazê-lo voltar à razão. Paulatinamente, esse contingente foi reforçado com a chegada de Don Pedro de Alvarado, conquistador do México, que havia alcançado os Andes, a partir de Puerto Viejo, deixando, atrás de si, um número impressionante de vítimas. Mesmo Rumiñahui não estava sozinho. O exército de Zope-Zopahua e o de Quizquiz, vindo da região de Cusco, vieram juntar-se a ele. Os três exércitos operavam, separadamente, o que teria facilitado aos espanhóis combatê-los, um a um, com vantagens estratégicas.


No entanto, o que teria definido o conflito, fora a presença dos Cañari, que se aliaram aos invasores. Antigos inimigos do povo de Quito, acreditaram poder aproveitar-se da ocasião para derrotar seus "opressores" e obter liberdade. Abasteciam os espanhóis com os suprimentos necessários, encarregavam-se do transporte de bagagens e, na hora da batalha, eram os primeiros a entrar em combate, deixando que os espanhóis interviessem no meio da luta para resolver a situação.


As primeiras batalhas, no entanto, foram acirradas: Teocajas, Ambato, Pancallo e Latacunga foram favoráveis aos exércitos de Quito, que não perdiam terreno. Quizquiz, sozinho, matou quatorze inimigos em uma única luta, obrigando o exército espanhol a recuar. No entanto, um estranho fato fez com que fosse morto por seus próprios homens que queriam um estado de guerrilha.
Rumiñahui organizou táticas para lidar com os cavalos: buracos no chão cobertos por galhos e folhas, para impedir o avanço deles, mas, os Cañari seguiam na frente, desmantelando as armadilhas.


Quando os espanhóis, finalmente, entraram em Quito, encontraram-na incendiada e abandonada.
Perseguidos pela cavalaria, os guerreiros de Quito fizeram verdadeiros malabarismos, no entanto, estavam acostumados a batalhas rápidas, enquanto os estrangeiros a longas campanhas. As deserções cresceram, dia após dia, e Rumiñahui foi forçado a deixar a área, perseguido pelos inimigos. Restava-lhe um punhado de homens; o líder invencível tentou, ainda uma vez, a fuga mas, foi feito prisioneiro, depois de uma terrível luta. Pouco depois, Zope-Zopahua, também, caiu prisioneiro, aparentemente abandonado pelos seus e forçado a entregar-se. Rumiñahui e os outros foram submetidos a tortura, mas não revelaram nada. Vendo que seus esforços eram inúteis, os espanhóis decidiram pela sua morte e, em 25 de junho de 1535, Rumiñahui, Zopa-Zopahua, Quingalumba, Razorazo e Sina foram executados, de forma bárbara.




Rumiñahui, no Equador, é considerado "defensor de Quito", herói nacional e, sobre ele, muitas obras foram escritas. 




1) Llescas, segundo cronistas espanhóis.









 

QHAPAQ ÑAN - O CAMINHO DO GRANDE SENHOR.









"O jovem estacou, arfando algum cansaço, enquanto tentava suspirar e respirar, ao mesmo tempo. A visão dos Andes assolou seus sentidos, com mais força ainda, sufocando-o completamente. Experimentado em muitos caminhos, soltou a bicicleta, olhando seus companheiros, lá em baixo, e arfou de novo. 'Não, definitivamente, não existe nada parecido com isso.' Subira um pouco mais que os outros, conduzindo a bike com cuidado, arriscando-se, às vezes, para espiar. Haviam rodado uma centena de metros e chegado ao sopé de uma montanha e, depois de alguns minutos, depois de alguns arbustos, o monte de rochas cinzentas, desordenadamente arranjadas pela mão do tempo, anunciava, uns metros mais acima, o Qhapac Ñan, o Caminho Real (1), como uma fina linha cinzenta, subindo pelos penhascos, como todos tinham visto, perplexos, desde a quietude da estrada. Lembrou-se de tudo o que lera sobre o Caminho e constatou que palavras jamais poderiam descrevê-lo. Nenhum ser humano poderia descrever a emoção da descoberta. Foi como voltar quinhentos anos no tempo; foi como ver o ir e vir da Civilização da América. Sentiu um pouco de inveja de não pertencer a tudo isso e, então, pensou, 'estou aqui!'. Gritou para os companheiros que cenaram, sorrindo de volta, cheios de entusiasmo e alegria. Então, galgou, com força e segurança, os metros que o separavam do Qhapac Ñan. Pisou nele com a reverência de quem começa a voltar para casa. Gritou, 'ah!' com toda a força de seus pulmões, quase com raiva, misturando todos os sentimentos em um mesmo pacote. Não pensou nos rapazes, lá embaixo, esqueceu-se de tudo o que vivera até ali. Seus pés estavam, finalmente, sobre o Caminho do Grande Senhor."






A partir da praça de Wakaypata, que delimitava a dualidade da cidade de Cusco em Hanan e Hurin (Alto e Baixo Cusco), confluíam os quatro caminhos incas, pois a cidade era o centro de convergência da Rede Viária do Qhapac Ñan. Este, com suas confluências, foi a chave de toda a organização social e espacial da vida inca, além de agregar funções adinistrativas, econômicas, políticas, religiosas e, também, bélicas. A partir do Qhapac Ñan, toda uma rede de caminhos secundários, igualmente importantes, ligava, completamente, o Tahuantinsuyo.


Pavimentadas com pedras, apesar da concepção das estradas não ter um padrão único e, sim, adaptado à geografia de cada região, foram feitas para durar. A largura das estradas também varia: em algumas áreas chega a ter 15 metros, em outras, atinge um metro e meio, para poder flanquear algumas ravinas ou barrancos. Ao longo de toda a rede viária, a cada vinte quilômetros, ou segundo a necessidade, havia construções chamadas tambos (2). Esses tambos podiam acomodar os transeuntes e viajantes, além de armazenar alimentos, grãos e roupas. O exército imperial inca, quando em campanha, também, servia-se desses tambos. O Qhapaq Ñan foi a base para o desenvolvimento do Tahuantinsuyo e sua consolidação como Império -  se estendia até o norte da Argentina, norte do Chile, Bolívia, todo o Peru e Equador, chegando ao sul da Colômbia. Unindo selva, serra e litoral, o caminho andino, que se desdobrava em todo um sistema de estradas e pontes, com um intenso tráfego de pessoas, animais e mercadorias, deixou de cumprir seu papel original assumindo seu lugar na História, como parte integrante da Cultura do Planeta.


O Caminho Principal possuía 5.200 quilômetros e ia de Quito (Equador) até Cusco (Peru), e terminava no que é hoje Tucumán, Argentina, cruzando montanhas e colinas, com alturas de mais de 5.000 metros. 


O Caminho da Costa, paralelo ao mar, possuía 4.000 quilômetros e ligava-se ao Qhapac Ñan através de várias conexões. Tanto este quanto a Via Costeira possuíam uma largura máxima de quatro metros.
São quatro as principais estradas. A primeira ia de Cusco (Peru) até Quito (Equador) e Pasto (Colômbia). A segunda estrada ia de Cusco para Nazca (centro do Perú) e Tumbes ( fronteira entre Perú e Equador). Uma terceira estrada principal ia de Cusco a Chuquiabo (Bolívia). E a quarta via levava de Cusco para Arica (Chile), com ramificações até o rio Maule (Chile) e San Miguel de Tucumán (Argentina).


O Qhapac Ñan tornou-se um caminho mítico e o símbolo de toda a grande Civilização da Antiga América do Sul, passando a representar, no coração dos que o buscam nos dias atuais, um sentido mais espiritual, mais fluido, mais imaginário, do que representava para o povo Inca em sua realidade cotidiana. O que era material assume, hoje, um caráter espiritual e aventureiro - unindo o passado ao presente, através de seu pavimento de pedras cinzentas; transportando-nos, de volta, às origens de uma América tão pouco compreendida.
Construído durante o auge do Império, no século XV, era seu traço de união e vetor de intercâmbio e circulação, irrigando-o com vida, conduzindo, diariamente, pessoas de todas as "classes", como militares, comerciantes, artesãos e... os chasquis. Estes, eram mensageiros que, revezando-se a cada cinco quilômetros, corriam pelas estradas, para levar toda espécie de mensagens, o que permitia que elas chegassem o mais rápido possível ao seu destino.


A cada sete quilômetros havia um Pukara (3) que controlava o movimento das estradas, a cada vinte quilômetros, um tambo, e a cada cinquenta quilômetros, chegava-se a uma cidade importante. Até hoje, mesmo através de caminhos menos preservados, pode-se chegar a todos os grandes lugares de cerimonial pré-colombianos, tais como Chavin de Huantar, Tihuanaku, Machu Picchu, Vale Sagrado do Urubamba, às grandes cidades do Império como Tumebamba e Cusco, numerosas ruínas de edifícios militares, comunidades rurais e centros urbanos, cidades coloniais históricas, como Ingarpica, Cuenca, Cajamarca y Tarma. Concomitantemente, pode-se, até mesmo, chegar a sítios arqueológicos de outras culturas pré-colombianas como a dos Cañaris, Mochica, Chimu.


Especificamente em Cajamarca, palco triste do que representou o "fim" do Tahuantinsuyo, com a prisão e morte de Atahualpa, o Qhapaq Ñan do Chinchaysuyo percorre a região, longitudinalmente, com caminhos secundários, transversais, o que faz com que Cajamarca esteja entrecortada de antigas estradas. De norte a sul o Qhapac Ñan, vindo de Huamachuco até Cajabamba, passando por Cauday, baixando ao río Crisnejas, subindo até Chancay pela subida do Inca, dali passando Ichocán, San Marcos, Namora, contornando a lagoa de Sulluscocha até chegar aos Banhos do Inca (Pultumarca, local favorito de Atahualpa), atravesando la zona de Shaullo. Dos Banhos do Inca, o caminho conduz a Cajamarca e, dalí, até Rumichaca, depois Incatambo (San Pablo), subindo, outra vez, até o noroeste, até Chancay Baños (Santa Cruz) passando pela área de Pucará antes de cruzar, várias vezes, la ravina de Huancabamba para alcançar, depois, Caxas e Ayabaca, em Piura. Completando, ainda existem vestígios desses caminhos de Cajamarca a Hualgayoc, a Bambamarca e a Celendín, na estrada para Chachapoyas. Há, ainda, um caminho transversal partindo de Huancabamba, em Piura, que passa por San Ignacio e Jaén, em Cajamarca, indo em direção a Kuelap em Chachapoyas. Outros, ainda, ligando Cajamarca à costa pelo vale de Chicama em La Libertad ou pelo vale de Jequetepeque até Lambayeque.




Ainda que os especialistas no assunto comparem o Qhapac Ñan à rede de estrada do antigo Império Romano, particularmente, creio eu que não possa haver comparação possível, visto que foi construído nas alturas dos Andes, chegando a cinco mil metros acima do nível do mar, com todas as dificuldades que a obra de engenharia teve de enfrentar para sua realização. É, definitivamente, uma das grandes maravilhas do mundo, atravessando quinze ecorregiões diferentes, quatro delas ameaçadas de extinção ( Yungas Peruanas, os Cerrados Secos do Marañón, o Matagal Chileno e a Selva de Inverno do Chile.





O "Qhapaq Ñan", O Grande Caminho Inca, que estendia suas veias através de suas estradas e trilhas, ao longo de quarenta mil quilômetros, unindo os Andes - montanhas, litoral e selva foi declarado pela Unesco, em 21 de junho de 2014, Patrimônio Mundial da Humanidade.
O reconhecimento permitirá financiamento de organizações internacionais para a conservação e a restauração dos caminhos e santuários erguidos em torno da via.

Na Bolívia,  há dois trechos desse caminho: o caminho "Takesi" e a rota do "El Choro". O primeiro se estende por 70 km e o segundo, por 90 km, ambos ao norte de La Paz.
Infelizmente, há  trechos descobertos em mal estado de conservação e muitos foram destruídos, alguns chegaram a ser usados por caminhões da atividade de mineração.

No Peru, o caminho teve vários setores afetados por agricultores e autoridades. Em Chachapoyas, na selva central peruana, foi destruído para que fosse construída uma trilha com espaço para veículos usados na mineração.



(1) Caminho Principal (ou Real).


(2) em Quéchua, significa descanso.


(3) Posto Fortificado, Aduaneira.









                                                                     

1.25.2011

QUENA - A VOZ DA MONTANHA, QUE CHAMA...




Quena é a flauta dos Andes, construída de madeira ou bambú que, antigamente, era feita de osso, argila ou metal. A típica quena dos incas possuía  vinte centímetros de comprimento, feita do osso da pata da lhama. Possuem seis furos em linha reta, na parte da frente.


Conta a lenda que...


Nos tempos antigos as Virgens do Sol , que utilizavam lã de vicunha para tecer os mantos sagrados, saíam para ir juntas aos mercados para escolher os mais bonitos novelos. Em uma dessas visitas, foram acompanhadas pela filha de um grande curaca (1). Andaram por um caminho que se alongava em meio a pequenas colinas até chegar ao seu destino. De repente, do alto, veio o som de uma flauta que só a filha do curaca parecia ouvir. Deteve-se ela e, então, como em um sonho, caminhou, lentamente, até aquele que tocava a flauta misteriosa. Quando alcançou o espaço aberto de onde estava vindo o som, pode observar que era um pastor de lhamas que, enquanto apascentava os animais, tocava seu instrumento. 


Apaixonaram-se no momento em que, em silêncio, se olharam...


No entanto, a diferença social que havia entre os dois era uma barreira a esse amor e, encontravam-se com dificuldade; só se viam quando ele a chamava com sua flauta, tocando a mesma canção que ela escutara a primeira vez. 
Uma tarde ela não veio. Em vão o pastor tocou a flauta, muitas vezes, chamando-a. 


O crepúsculo trouxe a noite quando ele, sem poder suportar mais, desceu até o povoado para averiguar a causa de sua ausência. A aldeia estava em festa e a moça que ele amava iria se casar com o filho de um curaca vizinho, inimigo do pai da garota. O noivo chegara com um séquito e muitos presentes. Os moradores olhavam, admirados, tanta riqueza, porém, com indiferença.
Quando a buscaram, para que recebesse o noivo, não a encontraram. Havia desaparecido como que tragada pela terra. Em vão, a buscaram. Pensou-se até que o pai não queria casá-la com o filho do inimigo. Houve ameaças e o povo saiu a procurá-la até nas aldeias mais afastadas sem, no entanto, lograr êxito.


Tempos depois acharam-na morta, no lugar onde, sempre, encontrava-se com o pastor de lhamas. Passou o tempo  e sua tumba, todas as manhãs, estava coberta de flores do campo. Um dia, porém, a encontraram profanada. 


O pastor, enlouquecido, havia tirado, de seus restos mortais, um osso da perna, fugindo para longe. Com o osso fez uma flauta que soava mais doce do que qualquer outra. E, todos os dias, ao entardecer, sentado diante da imensidão das montanhas, tocava sua flauta, como antes, chamando a amada, que não esquecia. Por isso dizem que a quena é tão suave e melancólica, porque nasceu da dor do amor...




 (1) Curaca: oficial do Império Inca, que ocupava a posição de magistrado, cerca de quatro níveis abaixo do Sapa Inca. Os Curacas foram os chefes dos ayllus ( clã da família ).





                                                                    







                                                                            

1.24.2011

A ESTÓRIA E O VERDADEIRO INCA.



Detalhe central do mural da  "historia del Qosqo"( por Juan Bravo), para o município de Cusco: a figura central é Pachacutec, como reconhecimento ao iniciador da expansão inca, a organização do Tahuantinsuyo e o legado que dura até hoje.


A Lenda do Amor Rebelde.


Essa estória de um autor anônimo deve ter servido para embalar muito sono de criança mas, como todas as lendas, servem para lições e para manter a memória viva. Não é diferente do que acreditar no Mapinguay, por exemplo, um enorme e corpulento animal, de um só olho e com as patas traseiras de boi terminadas em garras; a única maneira de destruí-lo seria cortando-lhe o olho. Para exemplificar o que digo, basta pensar na lenda do Chullachaqui, demônio da selva, criado, pelos padres espanhóis, para obrigar os incas a batizarem-se na igreja católica; ele aparece a todas as pessoas que não crêem em Deus e que não estão batizadas.


Bem, desse modo, leiam com bondade o conto de fadas que usei para ilustrar, de forma inversa, o que foi uma Civilização que pautava pelo cumprimento do dever de cada um para que os direitos de todos pudessem existir.



Ollantay:  Rebelião por Amor. 
  
Conta-se que o capitão Ollanta (ou Ollantay) apaixonara-se por Cusi-Coyllur, filha do Inca Pachacutec. Ao pedir a mão da princesa e ter seu pedido negado, revoltou-se, trancando-se em uma fortaleza. No entando, desse amor, a princesa Cusi-Coyllur dá à luz uma filha e o Inca Pachacutec morre de indignação e vergonha. 
O príncipe herdeiro, então, vinga-se, sitiando Ollanta e encerrando sua irmã em uma prisão. Depois de muitos anos, quando o Inca, finalmente, consegue a rendição da fortaleza, Hima-Sumac, filha do capitão e da princesa, intercede pelos dois, obtendo  perdão para ele e a libertação da mãe. 

Não que um Inca não pudesse apaixonar-se ou que não estivesse, enquanto ser humano, sujeito a isso. Mas, como disse, anteriormente, a estrutura do Tahuantinsuyo era uma verdadeira "máquina", com perfeitos encaixes, que não davam margem a atos  ¨desvairados¨. Em primeiro lugar, havia um respeito muito grande pela sociedade como um todo - ainda que ela fosse uma princesa, ninguém colocaria o Império em perigo por amor; a menos que ele não fosse Inca, o que não é o caso. 
Todos no Tahuantinsuyo sabiam qual era o seu lugar e o ocupavam com propriedade, era isso que garantia, sem ser preciso a força das armas; o funcionamento perfeito da "máquina" era o que proporcionava vida em abundância, prosperidade e fartura para todos. 
Também, nenhum Inca, muito menos Pachacutec, iria morrer de indignação ou vergonha. Antes, uma outra solução prática qualquer teria sido aplicada com referência ao tal capitão. 
Não  teriam perdido tantos anos, nem investido tanto, para sitiar uma fortaleza inútil, que não traria benefícios ao Império, nem acrescentaria nada a ele. Um Inca tinha suas responsabilidades, tinha também regras a seguir, não tomava decisões que não levassem a um bem comum - para isso contava com as Panacas, famílias nobres tradicionais que o circundavam, mesmo a sua prória Panaca; e todas elas ainda teriam de ouvir as múmias de seus ancestrais para tomar decisões. Isso era uma prática diária no Tahuantinsuyo. 
E, depois de tudo isso, dizer que a filha dos dois teria conseguido obter o perdão seria ultrapassar a loucura em si mesma. Viver no Tahuantinsuyo era uma dádiva; muitos povos, quando conquistados, por vezes sem a força de armas,  aceitavam fazer parte do Império, pois sabiam que isso era garantia de fartas colheitas e uma vida cheia de benefícios; benefícios esses que eram iguais para todos. As crianças, ao nascer, recebiam um "topo" de terra, o que lhes garantiria o sustento através da vida; os jovens, ao casar, recebiam ajuda para construir sua casa - ninguém ficava ao relento. Quando alguém morria, o "topo" voltava para o Estado para ser doado a outro recém-nascido. 
Para finalizar, trata-se de Pachacutec (Pachakutiq). Nada mais, nada menos do que o iniciador do Tahuantinsuyo. Sua figura representa o início de toda uma época de transição e reestruturação da sociedade inca, uma etapa de mudanças que continuaria, depois de sua morte, em 1471, com seu filho,  Tupac Yupanqui e seu neto, Huayna Capac. Foi ele quem, realmente, transformou o Tahuantinsuyo em um Império. 
Sua visão de Estadista e guerreiro conquistou muitas etnias e estados, expandindo seus domínios, sendo considerado um líder excepcional. Muitos hinos e épicos seriam cantados e contados sobre ele, como tributos a seus feitos.

Pachacutec, "aquele que muda o rumo da terra".

"... e os tais senhores caciques saíram de lá bem onde estava Wiracocha Inca e contaram a ele como o Inca Yupanqui os mandou ali para ver em que eram servidos, que eles o serviriam; e como Virachoca Inca os viu na sua frente e tão grande multidão de senhores e de tanto poder, regozijou-se muito daquilo (...) Depois de distribuir copos de chicha e porções de coca para eles, Viracocha Inca pôs-se de pé e considerando que, desde que seu filho mandara aqueles senhores e eles tanto o amavam e o queriam como senhor, era justo que ele também os encorajasse nisto. Fez-lhes uma certa oração, pela qual lhes agradeceu o que fizeram por ele e por seu filho, e que já sabiam (.. .) que até então tinha sido senhor de Cusco, e que saiu de lá por motivos que o moveram para isso; e que a partir de então Inca Yupanqui, seu filho,  seria  senhor da cidade de Cusco ”. Retirado de "Suma y Narración de los Incas", cronista Juan de Betanzos.




Ainda quando não havia sido designado como sucessor por seu pai, Wiracocha Inca, no momento em que este e seu filho Inca Urco, saíram da Capital, diante da iminência de um ataque mortal e sob terrível ameaça dos Chancas, tomou a si a tarefa de proteger a cidade e a vitória sobre eles fez com que Wiracocha o reconhecesse como sucessor em 1438. 


Implantou o sistema de mitmakuna, ou mitimaes -traslados- em todo o Tahuantinsuyo: eram grupos de pessoas enviadas pelo Estado a qualquer ponto conquistado pelo Inca a fim de realizar tarefas específicas de coesão. Colonizavam, ensinavam as técnicas e modos de produção cusquenhos, ou seja, da capital Cusco, ensinavam leis e costumes, divulgavam a religião dos Incas. Também controlavam as populações recém-incorporadas ao Tahuantinsuyo, produzindo os elementos básicos para cobrir suas necessidades, reproduzindo traços culturais para incorporá-los ao todo.
Com o aumento do Império, aumentou também a demanda de alimentos, moradias e necessidades básicas, pelo que Pachacutec investiu em uma série de obras de construção, como a formação de novos bairros , novas praças, etc,. Além  disso fez transformações na área agrícola, intensificando a produção, graças à criação de canais para melhor distribuição de água, bem como todo um novo sistema de armazenamento e a construção de plataformas - andenes - que eram terraços para plantio. Remanejou áreas, ao redor de Cusco, para que fossem utilizadas como sementeiras, relocando seus moradores, transferindo-os para outros lugares igualmente férteis.
Reedificou o Templo do Sol, tranformando-o de um humilde lugar de culto so sol a um suntuoso templo que passou a ser conhecido como Qoricancha (Templo de Ouro).
Foi quem organizou o Império em quatro regiôes, ou suyos (Tawantinsuyo - as quatro regiões), tendo como centro a cidade de Cusco, o umbigo, ou centro do mundo: a leste, Antisuyo, a oeste Contisuyo, ao norte o Chinchaysuyo e, ao sul, o Collasuyo. 


Diversas crônicas afirman que foi tambén um grande administrador, planificador, filósofo, observador da psicología humana e carismático general. Juan Díez de Betanzos em sua "Suma y Narración de los Incas" (1551) diz que Pachacutec foi um jovem íntegro, "muito virtuoso, gostava muito de ajudar os pobres¨.



                                    Monumento a Pachacutec em Aguas Calientes, 
                                              perto de Machu Picchu, no Perú.






1.23.2011

PIRERAYEN - LENDA DA FLOR DE GELO !!!







Na noite alta aparece Pirerayen, a flor do gelo, que perde suas pétalas com os primeiros raios do sol. No gelo, surgem as pequenas flores vermelhas, com a forma de um coração no centro mas, se alguém chegar, nesse exato momento, pensará que uma pessoa ferida teria caminhado, sangrando, desde a ponte de gelo até o paredão norte da lagoa que cai sobre as águas geladas. Por detrás do morro "La Corona"(a Coroa), o mais alto da "Cordilheira do Vento", encontra-se uma pequena lagoa, encaixada entre os morros, que dá origem ao arroio Huingan Có. Devido à sua altura e encaixe, possui trechos de geleiras eternas que, nem mesmo em anos muito secos derretem e durante a maior parte do ano a lagoa permanece congelada. Quando ocorre o degelo, no final da primavera, na nascente do arroio, uma ponte de gelo vai se formando que se estende em um túnel de mais de uma centena de metros morro abaixo.

Certa vez, a bela Millameulén (vento de ouro) disse ao seu amado Huilliman (condor do sul), que só casaria com ele se ele conseguisse a flor mais bela e rara encontrada no alto da Cordilheira. Como seu amado não voltava, Millameulén seguiu suas pegadas disformes, na neve, até chegar à ponte de gelo na nascente do arroio Huingan Có. Alí, notou que as pegadas se transformavam em uma linha vermelha, como sangue e, inclinando-se para olhar, pode observar que eram umas pequenas flores vermelhas que, apenas, se destacavam do gelo. Cortou uma flor e a aproximou dos lábios, chorando por seu amado perdido Huilliman. Com seu beijo apaixonado, um coração, totalmente branco, como a neve, formou-se no centro da flor. Compreendeu, então, que, seu amado, ao não encontrar uma flor digna de seu amor, converteu-se, ele mesmo, na flor mais rara, espetacular e bela da Cordilheira.
Para mostrar, ainda mais, seu amor, quando a menina começou a regressar, todas as flores murcharam, exceto a que levava presa em seu cabelo escuro. Pirerayen, a flor do gelo, é muito procurada pelos apaixonados, pois conta-se que devolve o amor perdido e fortalece o amor enfraquecido. 



Para os mais aventureiros e exploradores, Huingan-Có oferece visitas guiadas a pontos turísticos do lugar que exigem mais esforço e o caminho não é tão simples quanto os outros.
Entre os lugares para conhecer-se, com um guia, destaca-se La Corona, que tem uma subida de cerca de 2.992 metros acima do nível do mar, cinco horas de caminhada em ritmo acelerado para chegar ao cume.
Para chegar ao local onde o passeio começa deve-se tomar a estrada que leva para o bosque. Dessa maneira, chega-se ao setor de embarque para a trilha que conduz ao cume.
Durante o passeio pode-se apreciar a incrível paisagem que rodeia a Cordilheira do Vento e, a poucos metros do topo, a pequena lagoa, citada na lenda. rodeada por neves eternas, de onde nasce o Huingan Có. De lá de cima, uma vista panorâmica do local , com suas lagoas, rios e a majestosa Cordilheira dos Andes.
Outra visita guiada é o Monumento Cañada Molina, acessado pela Rota Provincial N ° 39, a uns7 km da localidade de Huingan-Co, a 1600 metrosdo nível do mar.
A área possui uma superfície de 50 hectares e é um local destinado a proteger as relíquias de ciprestes de cerca de 1200 anos de idade.
Por fim, os petróglifos de Colo Michi Có, lugar único em toda a Patagônia e América do Sul, considerado um dos locais mais importantes de arte rupestre.
Encontra-se o lugar viajando pela Rota Provincial 39, que se conecta à cidade de Varvarco. Os petroglifos estão a 1.890 metros acima do nível do mar e o local é composto por 600 blocos gravados; segundo estudos foram realizados por volta do ano 500 dC e têm um caráter religioso. Em todos os passeios recomenda-se um guia.











QUINARA - O TESOURO DO INCA.








Quinara. Os moradores relatam a caminhada de sete mil incas que carregavam o tesouro dos Templos do Sol, do reino de Quito, indo por essas trilhas, habilmente construídas, com destino a Cajamarca: ouro para o resgate de Atahualpa. 
Quando um grito de dor ecoou pelas terras do Tahuantinsuyo: "Chaupi punchapi rutayaca!”, “Anoiteceu ao meio dia! - grito que, desde a cidade de Cajamarca se estendeu pela terra. Com a notícia da morte de Atahualpa, Quinara, capitão de seu exército, enterrou, no próprio vale que estavam atravessando, o ouro que levava, daí surgindo o nome do lugar.

O Vale de Quinara está situado a uns cinquenta quilômetros da cidade de  Loja, a sudoeste, no Equador. O lindo lugar é explorado, turisticamente, misturando a beleza das flores exóticas a construções coloniais transformadas em hospedarias. Chega-se a Quinara através dos vales de Malacatos e Vilcabamba. 


De Loja podemos pegar um ônibus no terminal rodoviário ou um táxi-ruta, que transportam turistas até a cidade. De carro, os turistas têm duas opções: 1) estrada Loja - Vilcabamba - Masanamaca - Quinara, uma hora de distância. 2) A estrada Loja -Vilcabamba - Linderos - Tumianuma - Quinara, que leva uma hora e meia. O Pilar do Inca, as Pilastras do Inca e a Caverna do Inca, são lugares para se visitar. 


Quinara está a 1.300 metros acima do nível do mar e tem uma temperatura média de 21  graus centígrados. O  vale é  um lugar  ideal para  se  viver: clima  temperado,  ar fresco, alimentos orgânicos que permitem aos moradores uma vida longa e tranquila; um deles  tem mais  de cento  e  doze  anos,  tendo  passado sua  vida rachando lenha e 
plantando; comendo, apenas os alimentos que produzia...........

Esse clima bucólico embala uma das lendas mais tradicionais do lugar, muito contada pelos moradores das velhas casas das fazendas do povoado. Ainda restam as pedras removidas em escavações realizadas pelos caçadores de tesouro. A lenda do tesouro perdido começa em Quinara, onde empresários nacionais e estrangeiros tentaram desenterrar o ouro de Atahualpa que, segundo relatos, está em algum lugar do Vale banhado pelo rio Piscobamba. Até ali chegaram muitos historiadores que afirmam que "el mascarón", uma rocha de três faces, marca o lugar onde o tesouro está enterrado. A rocha está como base de uma antiga casa de fazenda, cujo proprietário tinha a fama de possuir uma parte do cobiçado tesouro que, no entanto não teria sido encontrado na totalidade.
O primeiro dono do imóvel foi Amador Eguiguren e depois de sua morte, seu filho Manuel Enrique. Anos mais tarde, com a reforma agrária, a fazenda foi dividida, sendo que, logo depois, Manuel também faleceu.
Os vestígios das escavações realizadas, ainda, permanecem no local, de onde Huasaque é um dos setores mais revirados: no conglomerado existem várias esculturas esculpidas pela ação do tempo.
É só falar com um dos habitantes para descobrir a história dos "siete huangos"( sete peças de ouro), ou carregamentos de ouro, enterrados em Quinara; percorrendo a velha Trilha Inca que passava pela Tuna, o Pico Azul e o Charalapo, todos lugares assim chamados em homenagem aos Incas. 
Quinara, estava bem perto de Cajamarca, já passara Cuxibamba e agora estava superando Vilcabamba (Wilcopamba), quando surge a notícia do assassinato de seu imperador. Ele descarrega a enorme carga de ouro que ele transportava, define um ponto concêntrico equidistante a um comprimento de som de apito a partir das três faces da rocha em três montanhas que cercam o vale sob as dobras da serra. Nesse ponto específico, ele enterra o tesouro, juntamente com as llamas. Antes devolver o ouro a Pacha Mama, do que aos traiçoeiros espanhóis.




                                                                            

1.22.2011

A CORRENTE DE HUASCAR E O TESOURO DE ATAHUALPA

 





Conta a História, com o aval de dezenas de registros de cronistas espanhóis e mestiços dos  primeiros  anos  da  Conquista,  que  o  Inca   Huayna  Capac,  no  apogeu  de  seu governo,   quando  o   império   havia  expandido  ao máximo  seus  domínios,  mandou fabricar   uma "waska" ( corda ou corrente,  da  qual  deriva  o  nome  Huascar )  -  de uns  200 metros  de  comprimento (1) com a grossura de um punho de homem, coberta de  placas  de  ouro  articuladas,  simulando  as   escamas  de  uma  pele de  cobra,  que cintilava  ao  sol. Nessa  época, Cusco  brilhava  com  seus  telhados  de  ouro  e com  as placas,  do   mesmo   metal,   que   revestiam   as   paredes   de  seus  edifícios.            (2)
A corrente de ouro foi mostrada em uma festa, na qual foi nomeado o primogênito, na Capital do Império, circundando toda a Praça Aucaypata, erguida pelas mãos dos nobres. Em meio a cânticos e hinos ao Sol, o futuro herdeiro do trono foi apresentado, em uma espécie de cerimônia de batismo ou "sutichay" para, futuramente, ser coroado como Huascar Inca, no momento da morte de Huayna Capac. 
Huascar Inca chegou a ocupar, no curto tempo de seu governo, o Palácio de Amaru Cancha, em Cusco (atual Universidade de Cusco, Capela de Lourdes e o Templo da Companhía de Jesus); nesse palácio, em uma sala sagrada, era guardada a corrente: a dos amarus ou serpentes. 
É possível que, com a guerra dos dois irmãos, Huascar e Atahualpa, a corrente tenha sido levada para Quito (3), ou como parte do resgate de Atahualpa ou, ainda, levada pela família do Inca ao fugir da cidade (rumo a Paititi).


Mas, onde, afinal, estaria escondida a corrente? 


Há relatos de que, ao saber-se da invasão espanhola e sua cobiça por ouro (tão desmedida era essa sede de ouro que, entre os andinos, criou-se a lenda de que os espanhóis alimentavam-se de ouro e prata em lugar de comida) (4), uma ordem foi dada para que se escondesse a corrente e que isso pode ter sido feito em uma lagoa, Canincunca (Q'oyllururmana), também chamada lagoa de Urcos. Desde então, tanto durante a época colonial quanto agora, todos a têm procurado; dezenas de empresas particulares já tentaram drenar a lagoa, sem sucesso, em busca da mítica corrente de ouro; alguns arqueólogos tentaram, pela última vez, há poucos anos. 
Como se sabe, os conquistadores não cumpriram a promessa de libertar Atahualpa, caso o resgate em ouro fosse pago, assassinando o prisioneiro soberano Inca. As noticias transitavam,  com rapidez, através do Império. Como resultado, o incessante envio de ouro e prata parou e, nesse ponto da história a lenda do tesouro de Atahualpa começa a nascer... Em Cajamarca, Pizarro e em Pachacamac, seu irmão Hernando, reuniam o cobiçado ouro mas, a maior parte das riquezas não chegou. Apesar de todo o ouro que usurparam, havia muito mais...


                                                           
                       General Rumiñahui




Um dos principais comandantes do exército de Atahualpa era Rumiñahui, que havia nascido em Quito, no ano de 1486, e que muitos historiadores asseguram ter sido meio-irmão de Atahualpa, ou seja, filho do Inca Huayna Capac. Nesse momento da história, Rumiñahui lutava contra Sebastián de Benalcázar, que fora encarregado de marchar contra ele. Sebastián havia enviado um mensageiro com uma cruz e uma oferta de paz - o cadáver fora devolvido, como resposta. Rumiñahui havia visto, em Cajamarca, um símbolo igual, nas mãos de um monge sinistro que acompanhava Pizarro. 
Rumiñahui reune, então, seus soldados e incita-os a lutar. Pode-se imaginar sua voz forte alertando-os contra esse inimigo, astucioso, que mentia e enganava por ouro, que estuprava mulheres e confiscava terras. Fortalecidos pela necessidade de combater por suas vidas e pelas vidas de suas mulheres e filhos, saem ao encontro dos usurpadores nas planícies de Tiocajas.
Apesar do lugar favorecer o inimigo - os espanhóis podiam movimentar-se, com facilidade, com seus cavalos, nessas planícies - e de ter, este mesmo inimigo, feito uma aliança com o povo Cañari, o que reforçava seu efetivo estrangeiro, os homens de Rumiñahui conseguem anular seu poder de força e, cada vez que matam um cavalo, cortam-lhe a cabeça para mostrar que, por sua vez, estes são mortais. 
Uma terrível batalha, que parava ao anoitecer, ao cair do sol, e continuava no dia seguinte, era travada e as planícies começavam a tornarem-se cheias de armadilhas para os espanhóis com seus cavalos, cobrindo-se de sangue e morte.
Ao que parece, alguém ensina a Benalcázar um caminho seguro para fugir até Riobamba. Rumiñahui decide, então, atacar a cidade. Na hora do ataque, o vulcão Tungurahua entra em erupção. Em meio ao caos, enquanto as pessoas fugiam, aterradas, sob a chuva incandescente, indefesas, os espanhóis matavam-nas, sem piedade.
Rumiñahui retira-se, então, com seus soldados, até Ambato. Dalí, segue para Quito, onde tratará de abrigar os feridos e, no caminho, esconde o tesouro de Atahualpa na região sul de Sigsig, no sopé da cordilheira oriental dos Llanganates.







A VOLTA DO FANTASMA DE RUMIÑAHUI
NOTÍCIA RECENTE!!


(Serviço Informativo Iberoamericano - outubro de 1999)
O acidente de um helicóptero, no qual viajavam quatro arqueólogos, no sul do Equador, revelou que buscavam o ouro do imperador Inca Atahualpa, que foi escondido, há vários séculos, em um local nunca revelado. 
Os cientistas pertencem a um grupo de quatorze pesquisadores da Associação dos Pesquisadores da Marinha das Índias e do Instituto de Arqueologia Náutica da Universidade do Texas e da Fundação Widam; desde novembro de 1998 realizam pesquisas sobre o famoso tesouro.
Os pesquisadores, desde essa época, vivem na área mais ao sul de Sigsig, no sopé da Cordilheira Oriental ou Llanganates, onde presume-se que o guerreiro Inca Rumiñahui tenha escondido o ouro no Reino de Quito, o que seria o pagamento de resgate de seu irmão, o imperador Atahualpa, assassinado pelos espanhóis em Cajamarca.


Os arqueólogos acreditam que, embora exista um pouco de lenda, de fato, há elementos verossímeis e uma boa possibilidade de que o ouro esteja na área de Sigsig, onde também estão estudando vestígios antropológicos e arqueológicos.
O chefe da missão, Michael Paret, disse que, após investigação no Archivo das Indias, em Sevilha, descobriu a história de Ayllón (Sigsig) e da "lagoa encantada", na qual, aparentemente, poderiam estar escondidos os objetos de ouro que iriam servir como resgate de Atahualpa.
Paret afirma que, de acordo com o estudo realizado no Museu da Índia e com base em comparações de escritos sobre o tesouro, ele existe. ''Pode ter-se criado uma lenda em torno dele, como sempre acontece com fatos históricos como esses, mas o fato ocorreu e o ouro deve estar em algum lugar. Está provado que os escritos que se referem ao resgate de Atahualpa são noventa por cento verdadeiros.''
O primeiro passo da pesquisa foi encontrar evidências de restos humanos, da época, no fundo do lago Sigsig mas, enquanto realizavam as investigações, foram surpreendidos por um grupo de mineiros que extraem ouro no lugar, de forma artesanal, que quiseram expulsá-los por pensarem tratar-se de mineiros estrangeiros. Isso obrigou-os a solicitar proteção às autoridades locais e a contratar um helicóptero, para que, concluída a primeira fase, pudessem deixar o local sem ter de passar pela área de mineração. No entanto, apenas quatro conseguiram sair porque, na segunda viagem, enquanto viajava de Sigsig para Gualaceo, o helicóptero acidentou-se, devido a uma rajada de vento que o desestabilizou, atirando-o nas águas da chamada "lagoa encantada". Os quatro arqueólogos americanos, feridos, conseguiram salvar-se.
Para alguns moradores locais, o acidente foi causado pelo espírito de Rumiñahui, que não permitirá que o segredo seja descoberto. Rafaela Curuchumpi, uma das moradoras da área, acredita que não se deva brincar com os fantasmas dos antepassados, o que pode trazer má sorte. "Por que procurar um tesouro que, seguramente, foi levado pela lagoa e é protegido pelos bravos guerreiros de Rumiñahui. Essa ambição pode ser muito negativa", disse ela.


Outro expedicionário famoso foi Ralf Blomberg , nascido na Suecia, em 11 de novembro de 1912. Foi explorador, escritor, fotógrafo e cineasta. Faleceu no Equador em 1996. Realizou 6 perigosas expedições em busca do tesouro escondido por Rumiñahui. Sua obra mais importante foi Guld att hämta ( Oro enterrado y anacondas) , Gebers, Estocolmo, 1956. Também produziu  dois documentários sobre o mesmo tema: Jakt på Inkaguld ( En busca del Oro Inca) Rolf Blomberg & Torgny Anderberg Formato: 16mm Ano: 1969.
(por Kintto Lucas, Correspondente do Serviço Informativo Iberoamericano da OEI, Quito, Equador)




(1) Alguns autores chegam a afirmar 700 pés. 


(2) talvez através do túnel que saía desde o Qoricancha (Templo do Sol), em Cusco e que levava até Quito (Equador), a existência desse túnel ainda está sendo pesquisada por arqueólogos.

(3) “Temos absoluta certeza - diz o cronista Cieza - de que nem em Jerusalém, nem em Roma, nem na Pérsia, nem em qualquer parte do mundo, por qualquer república ou rei do mundo, havia tanta riqueza de metais de ouro e prata e pedras preciosas reunida em um só lugar como nesta praça de Cuzco ". (cronista Pedro Cieza de Leon, La Cronica del Peru).

(4)  Poma de Ayala , Nueva Crónica, l6l5, pág. 369,370


 BIBLIOGRAFIA


1) Eliade, Mircea, "El mito del eterno retorno", Ed Alianza, 2000 
2) Pease, Franklin, "Los últimos Incas del Cuzco", Alianza, l99l


ver também: Rivero y Tschudi, Antigüedades peruanas p. 213). (Citado por Memorias sobre las antigüedades neogranadinas : Uricoechea Ezequiel) 


OBSERVAÇÃO: Esta foi uma de minhas primeiras pesquisas e eu, ainda, acreditava que o povo remanescente que ocupa toda a região andina fosse, de alguma forma, Inca. Não é verdade. Os Incas estão, infelizmente, extintos. Afinal, precisamos fazer uma diferença entre os Incas e os povos que eram 'incas' por agregação, vivendo com o povo inca, obedecendo suas leis e participando como se lhe pertencesse, porém, sem ser, verdadeiramente, inca. Os Incas casavam-se uns com os outros, sem misturar-se, pois isso era necessário por serem Intipchurin, Filhos do Sol. Como em todas as postagens que eu escrevo este assunto é retomado e explicado, não vou me estender aqui. Portanto, todos os povos andinos, que falam Quechua e Aymara não são Incas, embora continuem, guardando, como podem, o que restou de memória, cultura e, principalmente, segredos. Valorosos guardiães do tesouro Inca que precisa ser preservado para a volta dos Filhos do Sol, como  acredita-se que ocorrerá proximamente. Essa volta só pode ser entendida quando nós compreendemos o que significa ser Inca e acreditamos que eles sejam mesmo os Filhos do Sol e analisamos o milagre de sua presença na Terra. Assim, como um dia, do nada, eles chegaram como duas crianças divinas para iniciar uma Nação, deverão voltar para retomar sua tarefa, depois dos últimos quinhentos anos de 'inversão dos mundo'. Mas, essa é uma outra história...