4.11.2014

TAHUANTINSUYO - SOB OS OLHOS DO PUMA

               
                                        


Quando havia apenas névoa e escuridão, Wiracocha criou o céu, a terra e os primeiros seres humanos, os quais fez de grande estatura. Ele criou esse mundo dividido em dois lados opostos: o mundo do alto, onde se encontra o sol e a lua e o mundo abaixo, onde permanece o passado. Entre os dois, o mundo intermediário dos seres humanos. Os primeiros humanos, no entanto, desobedeceram ao Deus que os converteu em estátuas de pedra, deixadas em cavernas e montanhas. Então, houve um dilúvio e o mundo voltou à escuridão...

Desse dilúvio, sobreviveu um puma, ilhado no meio do lago Titicaca, de onde apenas resplandecia o brilho dourado de seus olhos.


Algum tempo depois, Wiracocha emergiu do lago e fez desaparecer a escuridão, ao substituir os olhos do puma pelo Sol (Inti) e a Lua (​​Quilla). De sua união nasceram dois filhos, o casal divino, Manco Capac e Mama Oclo, os dois primeiros Incas. Wiracocha foi a Tihuanaco e, misturando com água e lama do Titicaca aos seres que havia petrificado, fez homens e mulheres de menor estatura, criando uma nova humanidade.


Então...

Wiracocha deu a Manco Capac um bastão de ouro e disse a ele para percorrer os caminhos até encontrar um lugar especial na Terra. Nesse lugar, enfiando o bastão no chão, ele fundou o Cuzco, umbigo, ou centro, do mundo, a mais poderosa e bela cidade do Tahuantinsuyo. 
O Criador, em seguida, atravessou a Cordilheira dos Andes, chegou até a costa e desapareceu, caminhando sobre as águas do mar...


                                             


O puma é considerado o felino mais amplamente distribuído no território americano (em todas as Américas), podendo ser encontrado até os 5.000 m de altitude, na Cordilheira dos Andes, onde recebe o nome de "puma andino". É um animal inteligente, solitário, com hábitos noturnos, sendo, por isso, difícil de observar. 
Suas características provavelmente atraíram os antigos habitantes do Império Inca (Tahuantinsuyo) e seus antecessores, que sempre o viram como um animal mítico.

Houve um culto entre os Incas (talvez secreto, talvez apenas crença), no qual a Lua era consagrada ao Puma que, a cada noite, devorava um pedaço dela e, quando ficava satisfeito, a deixava crescer, novamente. Ele vivia no centro da terra e saía, de noite, para devorá-la.

De acordo com Vázquez de Espinosa, os Chancas, inimigos dos Incas, na época do Inca Pachacutec, e seus antepassados​​, adoravam o Puma. O cronista, que viajou, por volta de 1620 pela região de Andahuaylas, nos conta: "dizem que seu pai era um Leão, e assim o tem, e adoram, como Deus, e o tem por armas, e nas celebrações, geralmente, se vestem de peles de leões para mostrar coragem, como cada dia se vê nas festas que fazem ". Entre as quatro vestes rituais, que o Inca usava para o casamento e quando assumia o poder, havia um manto de pele de puma ou de um tecido assim tingido, bem como uma camisa com manchas, imitando as da pele do puma. Ambos os clãs têm o mesmo totem felino; pode ser que se trate de uma migração de símbolos míticos, que corre paralela à invasão bélica do oeste para a região de Cuzco. De acordo com Garcilaso, no Cuzco os curacas (líderes) se apresentavam na festa principal do Sol, chamada Inti Raymi "...nem mais nem menos que pintam a Hércules, vestida a pele de leão e a cabeça encaixada na do índio, pois os tais apreciam descender de um leão." (1)

Quando o Inca Pachacutec conquistou o território da confederação de Chimu, em meados do século XV, poucos anos antes da chegada dos espanhóis na América, algumas de suas crenças foram assimiladas, tanto quanto assimilaram seus domínios. O Inca expandiu seu poder nesse território, localizado entre as terras dos Moches até Paramonga, no sul, ao longo da costa do Peru moderno, império que era governado a partir da grande cidade de Chan-Chan. 

Os Chimu tinham o deus Kon como um mediador entre o céu e a terra, onde reinava o deus Sol Chatay, auxiliado pela Lua, Quillapa Huillac, a qual muitos consideravam mais poderosa do que o Sol, já que poderia reinar de noite e de dia, era capaz de encobrí-lo e fazê-lo desaparecer do céu nos eclipses. Em torno desses deuses maiores estavam os deuses celestiais, como os do relâmpago...

O povo Chavin era politeísta e adorava a deuses de características selvagens, já que suas esculturas mostram seres sobrenaturais com traços felinos como o puma, jacarés e serpentes, aves andinas como a águia, o condor e o falcão. O progresso econômico levou à construção de centros cerimoniais e cidades.
A religião Chavin implicava na transformação do ser humano através do uso de substâncias alucinógenas. Muitas esculturas representam a transformação de uma cabeça humana em uma cabeça de puma. O uso de alucinógenos (cacto de San Pedro - ayahuasca), para fins religiosos, era comum, de acordo com achados arqueológicos encontrados. A droga contida no cacto colocava os sacerdotes em transe, o que lhes permitia dilatar as pupilas e penetrar nas profundezas do templo em absoluta escuridão.

A iconografia de figuras antropomórficas felinas é uma importante característica da civilização Chavin. Todas essas divindades são representadas nas diferentes manifestações culturais como na cerâmica, artefatos de metal, tecidos e esculturas arquitetônicas. Chavin de Huantar era um ponto central, em especial para rituais religiosos.

Os templos Chavin mais destacados são: Chavin de Huantar 
(Ancash), Kunturwasi e Pacopampa (Cajamarca), Chongoyape (Lambayeque), Caballo Muerto (La Libertad), Garagay (Lima), Chupas (Ayacucho).


A cidade de Chavin tinha conhecimento avançado de acústica e de engenharia hidráulica. Durante a estação chuvosa a água corria através dos canais criando um som como um rugido. Isto faria com que o templo de Chavin de Huantar parecesse estar rugindo como um jaguar (puma). O templo foi construído em granito e calcário branco e preto. 
A cultura Chavín representa o primeiro estilo artístico muito difundido nos Andes. 


Todas essas civilizações pré-incaicas haviam influenciado a cultura dos povos que faziam parte do Tahuantinsuyo (Império Inca) não propriamente a cultura Inca, pelo menos no que diz respeito às crenças e religiões, mas a cultura dos diferentes povos e etnias incorporados por ela, através das guerras e conquistas.


                                    
                                          (o muro do puma)

A Fortaleza de Sacsayhuaman (Saqsaywuaman, em Quechua), foi construída, originalmente, para fins militares, para defesa contra a invasão de tribos hostis que ameaçavam o Império Inca. 
A partir da fortaleza se observa uma singular vista panorâmica dos arredores, incluindo a cidade de Cusco. Sacsayhuaman se encontra a 3.700 metros acima do nível do mar e a área onde se localiza corresponde à cabeça do animal sagrado, o puma, e uma das traduções desta palavra é, precisamente, 'cabeça de puma'. 
Pachacutec Inca Yupanqui, o nono Inca, redesenhou a cidade de Cuzco e moldou-a na forma de um puma deitado. 

O puma é o guardião das coisas terrenas .


(1) texto original (
...ni más ni menos que pintan a Hércules, vestida la piel de león y la cabeza encajada en la del indio, por que se precian los tales descender de un león." )